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A Mãe da água e um mal-entendido

O engenheiro nos convida a entrar. Isso não é tão ruim, fica mais fácil do que nós pensávamos. “Nós”, nesse caso, somos o meu vizinho-do-campo Josué e eu.

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Estamos no caminho de esclarecer um mal-entendido sobre a planejada mudança da Mãe da água

O meu vizinho está bastante preocupado com os desenvolvimentos recentes.

Todo o vale está sendo reorganizado. É tema de discussão em muitas famílias do bairro. A Mãe de todas as discussões, você poderia dizer, porque há muitos agricultores nesta área.

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Reorganizar os campos não era uma má idéia, porque ao longo dos séculos o vale tornou-se uma coleção de pequenos pedaços de campos, um para cada um dos herdeiros. Uma peça foi vendida aqui, uma vala foi trocada porque os cursos d’água são inescrutáveis. Em um certo ponto, era completamente ilógico como tudo era dividido.

Como resultado, o proprietário de um pedaço de terra num lado do vale teve que subir no trator para ir ao outro lado, à casa. E como o vale possui muitos proprietários, este parcelamento seria o único solução

Porque é claro que não se tratava de só um proprietário. É um grande vale, e todo mundo tem sua parte. Foram anunciadas reuniões, para as quais todos os proprietários foram convidados, para informar a todos sobre as próximas mudanças.

É uma operação enorme, a reconfiguração de 330 hectares

De acordo com Josué – eu o chamo de vizinho porque ele trabalha nos campos adjacentes – um erro foi cometido, e o engenheiro quer cavar uma vala em sua terra e colocar um tanque de água na nossa terra. Um tanque para irrigar as plantas ou árvores. Não é necessário para nós. As poucas árvores no terreno de campismo se comportam bem, à beira da vala. Também não é útil para o vizinho Josué. Para os 2,5 hectares que ele cultiva, precisa dum sistema de rega de calibre diferente.

Então temos que passar por lá. É assim que funciona em Portugal. Não ajuda ligar; melhor ver alguém pessoalmente

No caminho para Montemor-o-Velho, onde o engenheiro tem seu escritório, o Josué ficou ainda mais excitado: “Esses burocratas são todos iguais“, ele grita, o que achei difícil porque quase acima do limiar de dor naquele pequeno espaço que um carro é, mesmo com as janelas abertas, “ele está no escritório dele e o que ele sabe sobre a situação real?!

Para mim, é melhor não começar a falar sobre burocratas, porque, caso contrário, nós os dois estaríamos gritandos – com frustração (as minhas memórias de lidar com burocratas são demasiado frescas). Por isso, retenho-me de mais comentários e tento pensar em um tipo de plano.

“Vamos fazer o seguinte, Josué: ele tem que explicar-me tudo, porque quer instalar uma vala e um tanque, porque, para ser sincero, ainda não entendi, com aquela Mãe da água, e depois vamos ver. De qualquer forma, não pago 85 euros por ano por um tanque que não pedi e que não preciso.”

“Epa, então, vais fingir que és burra?” Josué pergunta e olha-me com apreciação. “Sim, tudo bem, vamos fazer isso. Ele precisa passar pelas Termas para ver a situação o próprio.”

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Uma vez dentro do escritório de engenharia, é muito mais fácil do que o cenário para o qual nos preparamos

O engenheiro é um homem amigável que está disposto a vir amanhã. Faz isso mesmo. Dez horas da manhã seguinte, ouvi Josué chamando: “Ó Helena! Helena!”(*)

O engenheiro amigável agora entende perfeitamente o ponto. Um erro técnico. A Mãe da água passará por baixo da estrada e será levada a uma vala de trânsito. A vala que atravessa o campo de Josué é cancelada e o tanque de água também.

Problema resolvido, em 10 minutos.

Suspiro profundo.

(*) Ellen é um nome estranho em português. Logo isso foi traduzido espontaneamente. Desde então sou "Helena das Termas", mas há mais e mais pessoas que não têm problema com Ellen.