“Aquele empreiteiro também já não sabe o que fazer”, diz amiga J., que está a contar uma história maravilhosa sobre a sua vizinha ucraniana-russa Maria enquanto tomamos café. Maria está em dificuldades com o seu contratante português, que segundo ele “fez tudo o que podia”.
Abordagem estrangeira à arquitetura portuguesa
A Maria queria uma janela no telhado. Absolutamente. Agora. Não consigo viver mais sem janela. “É Outono, não seria melhor esperar até à primavera?” um conhecido sugere cautelosamente, mas não. Tem de acontecer agora, porque se ela não consegue olhar para as estrelas na cama, a vida não vale nada.
Claro que a Maria não disse tudo isto – nem a conheço bem, mas é a minha interpretação da paixão das pessoas de Europa de Leste, e uma boa preparação para o drama que avizinha. E também é muito reconfortante para mim, porque no ano passado queria muito remover um pedaço do telhado. Achatá-lo, livrar-me daquela ponta podre, e isso tem de acontecer agora, caso contrário a vida deixa de ter sentido.
(Os holandeses também podem ter um pouco desta paixão pelo Leste da Europa, sabia?)
Ainda não conhecemos bem a arquitectura portuguesa, os empreiteiros, e as circunstâncias
A decisão mais estúpida de todas, sei-a agora depois de um Inverno. Assim posso simpatizar com as suas aventuras, que ouço de amiga J. (amiga comum, apoiante e confidente de muitos emigrantes).
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“O que é que ela vai fazer agora?” pergunta J., e distraidamente dá mais um gole na sua chávena vazia, “Falei com ela ao telefone ontem, ela estava a chorar, está a verter, e ninguém pode fazer nada. Aparentemente. Já espalharam silicone por tudo, mas ainda está a verter.”
“Meu Deus”, suspiro com simpatia, “então nada de observação de estrelas, mas de esvaziar baldes. Isto é um confronto com a dura realidade.” “Sim, e o contratante quer agora que ela assine uma declaração de que esta é a última coisa que faz e que está para além da sua responsabilidade”.
“O quê?” Estou surpreendido: “Como é que consegue-se algo sem fugas nesta época chuvosa do ano?” Só a humidade e depois toda aquela chuva por cima. Não há nenhum produto no mundo, que eu saiba, que agarre e seque nestas condições. E isso tem sempre de ser feito com algum tipo de lubrificante.”
O que faria se fosse a Maria?
A minha teimosia holandesa faz-se ouvir sob a forma de uma vozinha presunçosa: “Mas eu nunca o teria feito…” “Oh, não?” a voz bully da minha consciência responde: “E o seu telhado plano, e a sua condensação, e o seu teto bolorento por causa disso? Esse ponto do telhado desapareceu, sim, mas será que já deixei claro o meu ponto de vista?”
Pois, a abordagem estrangeira à arquitectura portuguesa nem sempre é a mais inteligente
Bom. Ponto levantado.
“Compraria um pedaço grande de plástico”, digo com firmeza, “na Cooperativa de Soure, por exemplo, e depois colocá-lo-ia generosamente sobre aquela claraboia, e prendê-lo-ia muito bem com pedras, vigas e coisas desse género. E só na primavera verá o que pode realmente fazer a esse respeito. Aquele empreiteiro não está bem da cabeça para querer fazer isto agora. Não é boa ideia, claro.”
Esta ideia funciona bem. A execução decorre da seguinte forma. Na semana passada, uma semana cheia de vento e chuva, aquelas duas mulheres corajosas subiram ao telhado com uma escada. Armado com um enorme pedaço de plástico com 6 por 6 metros e algumas pedras. Acabou por ser muito difícil colocar aquele enorme pedaço de plástico no telhado com o vento forte, por isso estavam já com bastante dificuldade em só ficar em pé.
Depois ouviram um grande estrondo.
A escada caiu e lá estavam elas naquele telhado. Um céu negro ameaçador surgiu – claro, naquele preciso momento – e a claraboia estava firmemente fechada. Felizmente, a vizinha estava parada em frente à janela. E amiga J. acenou: “O que é o grito para ajuda em português? Não me lembro.”
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Ela deve ter acenado muito amigavelmente, porque a vizinha acenou de volta alegremente e fez menção de ir embora. “Seguro! Seguro!” J. gritou, rindo desesperadamente, e felizmente isso foi compreendido, apesar de ela gritar a palavra errada.
A vizinha entendeu que tinha de ser “Socorro!” e dirigiu-se para lá para colocar novamente a pesada escada no lugar, devido ao vento que aumentava.
Enquanto isso, também estou a verter. Dos meus olhos. De tanto rir.
Graças a Deus que mais pessoas tomam decisões estúpidas. Não sou o único.
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Nos mudámos em 2000 de Roterdão, Holanda para Termas-da-Azenha, Portugal. Uma mudança significante, especialmente com duas crianças pequenas. Estamos ocupados para reconstruir uma das heranças culturais portuguesas: Termas-da-Azenha, um antigo spa que foi transformado em várias casas de férias, quartos de hóspedes e dois terrenos para acampar, com muitas coisas divertidas para fazer.
Sala de convívio com jogos como pingpong, matraquilhos e bilhar, e uma coisa única no mundo: o Camarim.
Vai encontrar mosaicos e pinturas em todos os lugares.
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